Há saídas criativas para promovermos nossa saúde e obtermos melhor qualidade de vida.
Atentando para dentro de nós mesmos, descobriremos através da nossa respiração, dos batimentos cardíacos, dos nossos sons viscerais, uma verdadeira "orquestra" interior onde cada um com seu corpo sonoro através dos seus mais variados ritmos internos, poderá detectar algum mal funcionamento físico ou mental, pois esses instrumentos corporais que muitos mal conhecem, nos possibilitarão o reconhecimento de disfunções.
Ruud (1991) salienta que a saúde é um fenômeno que se estende além do indivíduo para abranger a sociedade e a cultura. Como saúde individual, ela não poderia ser higidez do corpo, mente e espírito em uma sociedade e em uma cultura que não são saudáveis. Por outro lado, uma sociedade e uma cultura não podem ser saudáveis se os indivíduos em seu interior não são hígidos de corpo, mente e espírito.
Bruscia (2000) afirma que a saúde de cada indivíduo, a sociedade e cultura estão completamente vinculadas ao meio ambiente. Assim, a saúde abrange e depende do sistema ecológico completo, desde o corpo, a mente e o espírito com suas interações no indivíduo até os contextos mais amplos das relações do indivíduo com a sociedade, a cultura e o meio ambiente.
"O corpo ocupa o espaço na natureza e as idéias e emoções é que fazem, junto com o corpo, o contato do ser-no-mundo." ( Barcellos, 1992). Ela nos diz ainda que:
..."a música acompanha cada homem desde antes de seu nascimento até o momento em que morre [ ...]; é utilizada como elemento de expressão individual e coletiva e se insere em quase todas as atividades do homem."
Pode ser aplicada como terapia e ser uma das saídas para o homem contemporâneo que vive nesta sociedade conturbada.
Durante o século presente se abandonou e perdeu quase toda a crença na música como força capaz de mudar o indivíduo e a sociedade. Na relativa falta de importância que o homem do século XX atribui à música, a nossa civilização subsiste virtualmente só. Isto é uma questão controvertida pois pode ser resultado do progresso tecnológico ou supermaterialista do mundo. Nem todos os homens modernos ignoram as possíveis relações entre música e civilização e seus efeitos.
Ratificando essas observações, David Tame (1997 p. 26) dá vários exemplos que reforçam a nossa crença em que a música tem uma força que age sobre o mundo a nossa volta. Uma força que exibe um aspecto físico visível e audível e talvez um aspecto místico.
A música é um estímulo potente para a evocação de lembranças e é lembrando que podemos avivar fatos inconscientes que ampliam o significado do "ser velho".
O velho sente as transformações físicas acarretadas pelos anos e precisa adequar-se sempre. Contudo é na rejeição da sociedade em relação a ele que começa a conceber-se como idoso. Por isso Sartre afirma ser a velhice um "irrealizável":
..." é uma situação composta de aspectos percebidos pelo outro e, como tal, reificados que transcendem nossa consciência. Nunca poderei assumi-la, tal como ela é para o outro, fora de mim".
A memória, reativada pela música, faz a senescência ser encarada como tempo de lembrar. Momento em que o idoso pode reconstruir e reviver passagens significativas de sua mocidade e resgatar sua identidade.
Lembrar, muitas vezes, não é reviver, mas refazer, reconstruir, repensar com as imagens e idéias de hoje as experiências do passado. Memória não é só sonho, é trabalho. Esse trabalho que emerge através do fazer musical, além de prazeroso, nos leva a elaboração consciente de material inconsciente que vem à tona, impulsionado pela música.
As possíveis releituras durante a vida são como um "abrir de baús" de que nos falam tantos poetas e escritores. Uma apreensão do tempo dependente da ação passada e da presente e um tempo que fosse abstrato e a-social nunca poderia abarcar lembranças e não constituiria a natureza humana." ( Bosi, 1987 p. 344)
Numa sociedade pobre em rituais públicos de passagem, sobretudo de passagem para a velhice, nos momentos em que os velhos se entregam às reminiscências, podem construir pequenos rituais de reforço à sua identidade e a seu papel no grupo social. O ritual está presente como tema das lembranças dos tempos de menino/a, nas festas familiares, nos rituais religiosos etc. Esses ensinamentos, que serão possivelmente reconhecidos por outros, constituem-se num verdadeiro acervo moral para aqueles que o ouvem e pretendem transmiti-los, sendo uma importante experiência de vida.
Através do rememorar, podemos voltar ao tempo passado e tornar presentes fatos possíveis que, reelaborados, nos sirvam de introspecção, que nos levem a outras saídas.
Essas saídas são oportunidades e esclarecimentos que passamos a conhecer . Cada qual deve fazer suas próprias opções e o passo fundamental para a conquista da liberdade interior é optar por si mesmo. A liberdade não chega automaticamente: é conquistada, e não é de uma só vez. Precisa ser conseguida dia-a-dia.
A responsabilidade para consigo mesmo assume novo significado. A pessoa aceita as responsabilidades da própria vida não como uma carga e sim como um valor por ela escolhido. "A liberdade e responsabilidade andam juntas: quem não é livre é um autômato, não tem responsabilidade e, se não é responsável por si, não pode ter liberdade." ( May, 2000). Ao optar por si mesma, a pessoa se torna cônscia de ter escolhido, conjuntamente a liberdade pessoal e a responsabilidade.
Todos nós estamos envolvidos e devemos ser responsáveis pelas escolhas que fazemos. Quando aceitamos as realidades, a liberdade está implícita, não por cega necessidade e sim por opção. Quero dizer que a aceitação de limitações não precisa ser uma "rendição" , mas pode e deve ser um ato livre e construtivo.
" Talvez tal opção tenha resultados mais criativos para a pessoa do que se esta não precisasse lutar contra nenhuma limitação." ( May, 2000 )
Posso assegurar que a musicoterapia auxilia no processo de vida e também quando esse processo está "perturbado".
A maioria das pessoas tende a assumir certas regras que se originam em sua conformidade inconsciente com o que espera a sociedade. Para May (2000), "conformidade" e "dogmatismo" serve de estrutura inconscientemente assumida por muita gente, hoje em dia. De qualquer modo é melhor indagar a si mesmo, bem consciente, qual a estrutura que se adotou (May, 2000 p. 139).
Os atendimentos com clientes institucionalizados, do ambulatório e do consultório, me fazem entrar em contato com muitos migrantes de diversas regiões do Brasil e cada grupo deve ser compreendido com suas características únicas.
O respeito às características individuais de cada sujeito, devem ser somadas as responsabilidades para consigo mesmo e liberdade para optar pelas saídas a fim de enfrentar as intempéries da vida. "Não há dúvida que quem pensa compreende teoricamente que a liberdade e a responsabilidade andam juntas" [ ... ]" é uma lição em que todos progressivamente aprendem na luta pela conquista da maturidade". (May, p. 144).
MUSICOTERAPIA COM O IDOSO.
" ... a mutação que permitiu e todos os dias permite, que o "leito" do doente se torne campo de investigação e de discursos científicos não é a mistura, repentinamente deflagrada, de um velho hábito com uma lógica ainda mais antiga, ou a de um saber com o esquisito composto sensorial de um 'tato', um 'golpe de vista' e um 'faro'."
(Michael Foucault 1994).
Nada deve ser feito ao acaso nem de qualquer forma.
As atividades conscientes nos levam a alcançar com facilidade os objetivos que desejamos.
Perceber o nosso corpo, nossos sons internos e externos, os sons que nos cercam, o que esses sons querem e podem nos dizer será uma conquista diária e fundamental para mantermos nosso equilíbrio.
Uma dificuldade rítmica provavelmente virá de um desequilíbrio emocional que poderá estar relacionado com alguma patologia. Essa disfunção musical evidencia a existência de problemas como nos é ratificado por Gainza (1988) e Milleco(1992).
Usando música com prazer, fazendo dela uma linguagem, estaremos conscientemente contribuindo para maior compreensão do mundo e de nós mesmos. Estaremos evitando somatizar patologias. Estudos comprovam que a atividade muscular, a respiração, a pressão sangüínea, a pulsação cardíaca, o humor e o metabolismo, são afetados pela música e pelo som. O corpo funciona como caixa de ressonância onde o som é produzido e de onde é lançado no espaço. O corpo é um instrumento. A voz, o som singular de cada um de nós.
A musicoterapia pode lançar mão de técnicas, facilitando diversos processos: reabilitação, readaptação, prevenção, promoção de saúde.
Vemos então as seguintes definições:
Musicoterapia. Definição da Comissão de Prática Clínica da Federação Mundial de Musicoterapia - 1996 (Bruscia, 2000 ).
" Musicoterapia é a utilização da música e/ou seus elementos (som, ritmo, melodia e harmonia) por um musicoterapeuta qualificado, com um cliente ou grupo, num processo para facilitar e promover a comunicação, relação, aprendizagem, mobilização, expressão, organização e outros objetivos terapêuticos relevantes, a fim de atender às necessidades físicas, emocionais, mentais, sociais e cognitivas.
A Musicoterapia objetiva desenvolver potenciais e restabelecer funções do indivíduo para que ele/a possa alcançar uma melhor integração intra e interpessoal e, conseqüentemente, uma melhor qualidade de vida pela prevenção, reabilitação ou tratamento".
Podemos conceituar de outra forma, sabendo-se que é sempre um grande desafio definir musicoterapia e como nos diz Bruscia, " ela é transdisciplinar por natureza [...]não é uma disciplina isolada e singular claramente definida e com fronteiras imutáveis".(2000 p.7-8).
Musicoterapia é o desenvolvimento de um processo de tratamento em que se usa basicamente como elemento principal de trabalho, a música. Música no seu mais amplo sentido ( som, ritmo, melodia, harmonia), com uma intenção.
E música?
Filósofos, psicólogos e estudiosos de música estão às voltas com a dificuldade de definir música, há séculos. Na forma mais simples, para Bruscia, " música é a arte de organizar sons no tempo" (p.9) para Costa, "é a organização de relações entre sonoridades simultâneas ou não no decorrer do tempo. Sons e silêncio são combinados e encadeados entre si, formando ritmos, melodias e harmonias".
Como a música é usada de diversas formas em diferentes contextos, vamos clarificar sua utilização.
Quando a música é utilizada como terapia, a música assume o papel principal na intervenção e o terapeuta é secundário; quando a música é utilizada na terapia , o terapeuta assume o papel principal e a música é secundária. Quando a música é utilizada sem um terapeuta, o processo não é qualificado como terapia; quando o terapeuta ajuda o cliente sem utilizar música, não se trata de musicoterapia. As intervenções de musicoterapia são singulares por centrarem-se no som, na beleza e na criatividade. (Bruscia p. 23)
O que será então , música em terapia? E como terapia?
Barcellos (1992 p.20), ratifica, e nos diz que música em terapia é a utilização da música como uma técnica de mobilização da emoção e de sentimentos. É utilizada aqui, em geral, a chamada "música morta", isto é, discos, fitas ou rádio. O paciente ouve músicas e depois fala sobre os aspectos que foram mobilizados por elas. Ou ainda, a música como mobilização psíquica para quaisquer outras técnicas expressivas como o desenho, a pintura ou a modelagem.
A utilização da música como terapia difere da anterior porque em geral se utiliza "música viva" ou seja, o próprio paciente comprometido no processo de "fazer música" junto com o musicoterapeuta. (p.21) A música não será só uma técnica de mobilização, mas irá além disso. O paciente se expressará através da própria música e podemos enfatizar também a capacidade simbólica da música. Barcellos( p.21) cita Byinton: a " função consteladora da energia psíquica lhe confere o status de linguagem simbólica" .
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